Severina Gala Kalenga, de 30 anos de idade, nascida aos 27 de Março de 1995, natural da província do Huambo, é mãe de 5 filhos, dois rapazes e três meninas. Vive com os pais e 3 irmãos na comunado Casseque, município do Cubal, província de Benguela.
Severina estudou até 9º classe, onde parou por falta de apoio. Dedica-se a agricultura de subsistência e é actual secretária da cooperativa agrícola Mulher Rural.
Severina viveu muitos anos em um relacionamento abusivo com seu marido, com quem estava desde os seus 17 anos de idade. As constantes agressões físicas e psicológicas eram sempre conciliadas com as sentadas familiares. Muitas vezes fugia para a casa da mãe, mas por conta dos conselhos que recebia voltava para a casa do marido. Até que na quinta vez, grávida da quarta filha e doente, o esposo a abandonou sozinha em casa, tendo sido socorrida pela mãe que a levou ao hospital, “a partir daí decidi não voltar mais”.

Após anos separados, o ex marido não dava o sustento aos filhos. Para amenizar as dificuldades, Severina trabalhava nos campos de cultivo de outras pessoas e ganhava 750 kwanzas por dia.
Severina passou a viver em um isolamento quase total, com medo de denunciar ou pedir ajuda, acreditando que ninguém entenderia ou a apoiaria.
Há cinco anos, Severina decidiu fazer parte de uma cooperativa após ouvir de mulheres mais velhas as suas experiências de vida. Ela era uma pessoa muito tímida, não conseguia falar ao público, foi perdendo o medo de falar ao público através da participação de várias reuniões, capacitações e eventos realizadas pela cooperativa, pela ADRA e outras instituições.
Apesar desta transformação, Severina ainda sofria pela falta de registo dos filhos e por conta da recusa do ex marido a contribuir financeiramente para o sustento das crianças. Em conversas com a coordenadora da cooperativa, Adriana Jamba, ela soube que havia instituições que poderiam resolver o seu problema.
Foi então que, em 2021, sozinha dirigiu-se até a Direcção Municipal da Acção Social e apresentou o seu caso. Após meses de espera, João registou os filhos.
Em 2023, Severina soube que a ADRA estava a implementar o projecto Apoio Jurídico no município do Cubal. Ela participou de capacitações sobre violência doméstica com foco a fuga à paternidade, prestação de alimentos, igualdade de género, bem como, de auscultações jurídicas gratuitas. As formações ajudaram-na a desmistificar o ciclo de violência que vivia e lhe deuforças para continuar a agir.
“Nós viamos aquilo como uma coisa normal, mas depois da formação começar a se fazer sentir, nós vimos que aquilo era uma vantagem. Nós mulheres não podemos nos fechar, temos que compartilhar com a comunidade”.

Juntamente com a técnica da ADRA e a coordenadora da cooperativa deram entrada do caso de fuga à paternidade aoTribunal.
O processo judicial levou algunsmeses, mas com a ajuda da advogada e a persistência do grupo de monitoras, Severinaconseguiu garantir a pensão alimentar de 15 mil kwanzas mensal e ajuda em casosde doença dos filhos.
“Antes falava que esse tipo decaso não podemos falar no meio do público nem nos sobas, porque um dos dias vão te indicar dedo na rua mas nós vimos que aquilo era tabu antigo. Se você se fechar mais você estará a sofrer, mas se estiveres aberta o teu problema pode não acabar 100% mas vai diminuir”.
Em 2023 a situação tomou uma reviravolta inesperada com uma ligação a informar que o ex marido acabara de falecer no Lubango.
Com os filhos órfãos, Severina foi obrigada a deixar de depender unicamente da actividade agrícola, recorrendo aprestação de serviços de lavandaria para o sustento dos filhos.

Em Dezembro de 2024, por intermédio do projecto Apoio Jurídico, beneficiou de um kit de pastelaria, um forno, botija e os seus assessórios.
Com a formação sobre transformação de alimentos, no âmbito do projecto PAUERC, Severina passou a confeicionar bolos e bolinhos. Actualmente, vende os bolos pequenos (queques) cada 100kz eos bolos maiores a 2000kz.
Com o dinheiro do negócio dos bolos e bolinhos tem sustentado a casa, consegue pagar a propina, comprar roupa e calçado dos filhos, e recentemente, conseguiu suprir os gastos do acidente decarro do pai.
Hoje, Severina faz parte do grupo de monitoras de casos de violência doméstica no seu município, e continua envolvida tanto na cooperativa como no projecto, a apoiar outras mulheres a encontrar coragem para superar situações similares. E compartilha sua história para inspirar outras mulheres que, como ela, já passaram por situações de violência doméstica.
Grupo de Monitoras
Com o lema “se uma mulher cai,a outra ajuda a levantar”, o grupo de monitoras dos casos de violência doméstica é contituído por dez mulheres do município do Cubal que desenvolvem acções de identificação, sensibilização e apoio de mulheres vítimas de violência.
Juntas têm desenvolvido diversas acções que visam sensibilizar outras mulheres a denunciar e encaminhar os casos de violência para as instituições de direito (Acção Social, Polícia ou Tribunalda Família). Através de palestras, debates na rádio Cubal entre outras acções,em parceria com a Direcção Municipal e Provincial da Acção Social.

O grupo de monitoras é fruto do projecto Apoio Jurídico, implementado pela ADRA com o financiamento do colectivo Ondjango Feminista.
Este projecto tem como iniciativa ajudar as mulheres através da prestação de aconselhamento jurídico familiar gratuito, ajuda com o registo de menores, bem como, a representação ou apoio em acções de prestação de alimentos na sala de família,no município de Cubal, província de Benguela. O trabalho tem sido desenvolvido com o apoio do escritório de advocacia Nangacovie especializado em Direitos Humanos.
A história da Severina é um testemunho de que, com apoio adequado, é possível romper o ciclo da violência e recomeçar a vida.
“Deixo uma mensagem para as outras mulheres que estão a passar no mesmo caso que eu passei, não se sintam fechadas, quando sentem que um caso está a complicar, recorram a outras pessoas que podem ajudar.”